Há
um compositor que eu gosto bastante, cujo nome é John Dowland.
Penso
ser possível utilizá-lo em sala de aula, pois sua música é bastante simples,
porém "rica".
Sugiro,
utilizá-lo dentro das seguintes propostas:
1
- interdisciplinaridade com a disciplina Língua estrangeira: Inglês;
O
educador musical poderia propor ao professor de Inglês o estudo de um dos
poemas das canções de John Dowland. Nesse caso, seria interessante o cuidado
com o fato de que o inglês das letras, em alguns casos, é arcaico, como também
inglês britânico.
PS:
para quem não sabe, há palavras que no inglês britânico são diferentes do
inglês americano, como acontece também com o português de Portugal e o do
Brasil.
Ex:
elevador em inglês americano: elevator; no britânico: lift.
2
- suas canções são cantadas em inglês e geralmente acompanhadas por alaúde;
Aqui,
o professor pode realizar uma associação histórica dessa composição
"alaúde e voz" com a atual "violão e voz". Seria
interessante um estudo histórico sobre esses dois instrumentos.
3
- seus temas geralmente são melancólicos, falando sobre casos amorosos,
escuridão, trevas...
Essa
questão melancólica, envolvendo o "amor" é bastante atual e pertence,
em sua grande maioria, às músicas midiáticas. O professor pode, novamente,
realizar uma associação, como também mostrar ao aluno essas características nas
músicas ditas antigas, como é o caso de John Dowland.
A
questão "darkness" (escuridão/trevas) seria vista em outro contexto,
fora da temática "romântica". O compositor e instrumentista ficou
bastante conhecido por essa questão darkness,
com músicas como Mourn, day is with darkness fled e In darkness let me dwell.
Mourn, mourn day is with darkness fled
&
In darkness let me dwell
ou
ou
Há outras versões no Youtube, dessas duas canções.
4
- Questões musicais, da música Mourn, day is with darkness fled
:
-
muitas músicas são, ao mesmo tempo, modais e tonais; exatamente nesse período, a utilização de acidentes na música modal (música ficta) se fortaleceu e a inclinação para a utilização e aprimoramento do principio tonal foi se desenvolvendo, sendo, inclusive, a teoria sobre a retórica, sobre cada emoção que determinado tom "transmitia" sendo difundida.
-
fórmulas 4/2 e 3/2
-
alterações de emoções na música e a relação musical
Importante
colocar que nessa fase a letra regia 100% a música.
-
Curiosidade: os títulos das canções, geralmente, são a primeira frase da
estrofe.
-
andamento lento e rápido
-
utilização do recurso de "extensão de compasso", ou seja, a música estava
naturalmente em 3/2 e, em determinado compasso, em função da letra, fica em
5/2.
Eis um
pequeno resumo de um trabalho que fiz:
John Dowland (1562-1626) foi um importante músico, possivelmente inglês, da época isabelina. Destacou-se por suas airs por serem “notáveis pela sensibilidade na declamação do texto e pela sutileza melódica” (MASSIN, 1997, p.252). Entre 1598 e 1606, publicou uma série de coleções conhecidas como The First Booke of Songes or Ayres (1597), The Second Booke of Songes or Ayres (1600) e o The Third Booke of Songes or Ayres (1603)
Nesses três livros há a presença das características mais marcantes da obra de John Dowland: ironia e sarcasmo, como na música It was a time when silly bees, onde ironiza a vida na corte da rainha Elizabeth I e utiliza a “metáfora da rainha abelha cercada de vermes” (SCARINCI, 1997, p. 71), a visão melancólica da mulher como nas obras Can she excuse my wrongs e If my complaints, conotação sexual como no refrão “To see, to hear, to touch, to kiss, to die” de Come Again e a presença da idéia pessimista de vida, repleta do conflito entre trevas e luz, como em In darknesse let mee dwell e Mourne, day is with darknesse fled.
A melancolia está presente na ária Mourne, day is with darknesse fled, que é a quinta música do The Second Booke of Songes or Ayres (1600). Sua poesia possui 3 estrofes e sua temática é sobre o conflito do homem em relação ao céu e inferno, sombras e luz, sol e noite, de conflito existencial tão presente na obra de John Dowland.
LETRA:
Mourn, mourn, day is with darkness fled
Mourn, mourn, day is with darkness fled,
What heav'n then governs Earth?
Oh, none but hell in heaven's stead
Chokes with his mists our mirth.
Mourn, mourn, look now for no more
day
Nor night, but that from hell.
Then all must, as they may,
In darkness learn to dwell.
But yet this change needs must
change our delight.
That thus the Sun should harbor with the
night.
Pesar, pesar, o dia com a escuridão fugiu
Pesar, pesar, o dia com a escuridão fugiu,
Que céu, então governa a terra?
Nenhum, mas o inferno ao invés do céu,
Pesar, pesar, não mais procure pelo dia,
Nem pela noite, mas por aquele que é do inferno,
Então, todos como devem
Na escuridão aprenderão a viver.
Mas no entanto, esta mudança deve necessariamente transformar nosso prazer,
Que deste modo o sol deveria acolher a noite.
Agradecimento a "Tia Jô" pela tradução.
Agradecimento a "Tia Jô" pela tradução.
Por fim...
Plano de Aula:
Plano de Aula:
Dessa forma, com as informações que disponho aqui, somando-se à pesquisa que o professor também fará para a sua aula, acredito ser possível utilizar John Dowland em sala de aula.
Como plano de aula, faria algo como:
• apresentação de John Dowland (podendo seguir uma linha temática, como a questão romântica ou darkness)
• apreciação da música Mourn, day is with darkness fled.
Inicialmente, os alunos não verão o vídeo com a música sendo performada. Dessa forma, professor pode questioná-los sobre os aspectos que chamaram a atenção deles.
Depois, a turma vê o vídeo e o professor pode falar de aspectos como a forma, estilo, a forma de cantar, andamento e ritardandos, a língua inglesa, quais os instrumentos que fazem parte da música, as características citadas acima... tudo depende da série e do conhecimento prévio que a turma possui!
Por fim, o professor explica que nesse período, diferentemente do nosso, a parte musical seguia a ideia do texto e, para isso, os compositores utilizavam recursos expressivos, tais como word paiting e recursos provindos da retórica, que era forte nessa fase. Um exemplo de retórica, que posso citar, seria:
- articulus: repetição de uma mesma palavra no texto para ressaltar a dramaticidade
- catabasis: passagem descendente, melodicamente ou em sequências harmônicas, representando sofrimento, tristeza ou a condição terrena do homem.
• ver a letra (seu teor poético) e sua tradução
• depois, o professor pode trazer esses aspectos para a atualidade, começando com a forma violão e voz, associando com a forma alaúde e voz e, depois, deixando como tema para casa, uma pesquisa sobre algum grupo ou artista solo brasileiro que possui temática darkness.
• Como prática musical, o professor pode propor:
a execução desse tipo de canção, que exige determinada colocação da voz (isso exigiria o ensino da técnica vocal), sem contar o inglês.
com movimentos corporais (estilo dança) a turma poderia tentar marcar o o andamento; pela música estar em função da letra, a expressividade adquire um caráter peculiar. O professor poderia, antes de utilizar essa música, realizar essa atividade com uma obra bastante "quadrada", com pulso bem definido e sem alterações e, após a execução dessas duas músicas, questionar sobre o que eles perceberam, suas diferenças e semelhanças.
a atividade de composição sempre é bem vinda, porém, acredito que os pais dos alunos não gostariam de ver seus filhos compondo algo "dakness" (hehehe); essa ideia ficaria melhor utilizada mo aspecto "romântico" de John Dowland.
Ainda há outras músicas conhecidas que podem ser utilizadas em sala de aula, com outro eixo temático. A música Come Again, além de ser bastante alegre, foi performada pelo cantor contemporâneo Sting.
Também há a famosa Flow my tears
O educador, através da sugestão dos textos sugeridos logo abaixo, pode também se aventurar a pesquisar as outras características presentes na música de John Dowland, sendo uma delas a questão de romance.
A canção Can she excuse my wrogns?, como o próprio título nos instiga, fala disso.
A partitura dessa canção você encontra nesse link: http://artsongcentral.com/2008/dowland-can-she-excuse-my-wrongs/ e a partitura nesse: http://artsongcentral.com/wp-content/uploads/lute118.pdf
Sugiro a leitura de 3 trabalhos:
BURMESTER,
Roger. Análise retórico-musical das
Árias Flow my tears e Come, heavy sleep, de John Dowland
(1563-1626).
POULTON, Diana. John Dowland . Published by Faber & Faber. 2nd edition, 1982. Disponível em: http://www.ucpress.edu/op.php?isbn=9780520046498
SCARINCI, Silvana. Elementos
para interpretação da obra de John Dowland (com ênfase nas pavanas e
galhardas). Campinas, 1998. Dissertação
de Mestrado. Disponível em: http://www.bibliotecadigital.unicamp.br/document/?code=vtls000186583
Nesse site, é necessário fazer um cadastro.
Nesse
site há algumas partituras: http://artsongcentral.com/song-index/
Era isso.
Fui.
Professor Tiago, bom dia! Meu nome é Jobi - sou cantor de canção de câmara e professor de canto e de língua portuguesa. Bom ver alguém sugerir este valioso repertório para as aulas de inglês. Uma das gravações que sugeriu é da fantástica cantora inglesa Emma Kirkby. Junto a ela, há também excelentes cantores - tenores, barítonos e baixos que também cantam Dowland, como Paul Elliot, Paul Hillier, por exemplo. Este último, aliás, lançou um CD chamado Bitter Ballads: ancient and modern poetry sung to medieval and traditional melodies. Encontrei o seu blog pois procurava traduções dos poemas das canções de Dowland para usá-las num curso de história crítica da canção de câmara que elaborei. Espero que não se importe que eu as utilize, indicando, claro, a fonte.
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